2018/06/25

Espionagem indiscriminada dos cidadãos pelos operadores resulta em queixa na Comissão Europeia


A descoberta que os operadores de telecomunicações norte-americanos têm vendido dados sobre a localização de todos os clientes, e a recente entrada em vigor da GDPR / RGPD europeia parecem ser os factores ideais para que por cá se acabe com a recolha indiscriminada de metadados pelos operadores de telecomunicações, que já foi invalidada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.

Actualmente, quase duas dezenas de países Europeus, onde se inclui também Portugal, têm leis que obrigam os operadores de telecomunicações a guardar os metadados referentes às comunicações de todos os seus clientes por um período de 1 ano. Estes metadados não guardam a gravação das chamadas ou conteúdos das mensagens que se recebam ou enviem, mas guardam todos os restantes dados a elas associados: destinatário, data e hora, duração, localização aproximada, etc.

O problema é que estes dados são suficientes para que se criem perfis bastante precisos sobre o utilizador e reveladores de dados bastante privados, como tem sido demonstrado por inúmeros estudos. A mera informação da localização, associada à hora do dia, assim como a frequência e padrões das comunicações, permite que com facilidade se saiba onde cada cliente mora, trabalha, onde passa o seu tempo livre, quem serão os seus melhores amigos, quais os membros da família com que se relaciona mais - e isto sem entrar em questões de saber se tem problemas de saúde (ao telefonar para clínicas ou médicos), e tudo o mais que se possa imaginar... até mesmo se o seu carro tem dado problemas, através de chamadas para alguma oficia ou mecânico.


Esta situação já foi levada por diversas vezes ao Tribunal de Justiça da União Europeia, que considerou inválida a Directiva 2006/24 que regulamentava esta recolha de dados, e que em Portugal foi transposta para a Lein.º 32/2008 de 17 de Julho. Lei que se mantém em vigor, não obstante ter sido invalidada pelo TJUE por não respeitar a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia no que diz respeito ao direito à privacidade dos cidadãos.

Isto culmina agora na apresentação de uma queixa à Comissão Europeia, assinada por dezenas de entidades e organizações europeias, incluindo a Associação D3 - Defesa dos Direitos Digitais em representação dos cidadãos portugueses. Refira-se ainda que a D3 apresentou também uma queixa junto da Provedora de Justiça, solicitando um pedido de fiscalização e constitucionalidade da Lei n.º 32/2008 junto do Tribunal Constitucional; mas que passados seis meses ainda não obteve qualquer resposta (parece que a garantir os direitos constitucionais dos cidadãos não é coisa que mereça prioridade).


O site Stop Data Retention disponibiliza também várias cartas tipo que poderão ser usadas por qualquer pessoa que queira juntar a sua voz a esta queixa e acabar com a recolha indiscriminada de dados sobre todos os cidadãos.

6 comentários:

  1. Que treta por amor de deus. Faz todo o sentido esta retenção dos dados e por mais tempo. O que deve é ser obrigatória para os operadores, proibido o seu acesso sem mandato e por outrem que não as autoridades.

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  2. Pedro Varela , eu por acaso tenho uma opinião completamente contrária há sua, eu sou daqueles que acho que este tipo de Big Brother só deve ser implementado por ordem judicial, e mesmo nesses casos os argumentos tinham de estar bem fundamentados .

    Cumprimentos

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  3. Pois, o que acontece é que sem o registo prévio e interdito, vai ficar sem qualquer elemento de prova antes mesmo de qualquer queixa ou suspeita. E não é nada big brother, isso era se estivesse sempre a ser monitorizado nem que fosse por um algoritmo. A única situação em que faz sentido considerar a recolha de dados nos moldes que defini, é assumindo que considera o policiamento de rua, a autoridade tributária, o big brother. De outra forma é dar ferramentas aos criminosos, porque depois da queixa eles já têm outros cartões e ficam offline.

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  4. Pedro Varela , os anos e a experiência de vida ensina-nos muitas coisas, acredite.
    O que descreve é um panorama inaceitável numa sociedade democrática e com a sua explicação percebemos que dessa forma todos os cidadãos são considerados suspeitos de serem criminosos, o que disse e repito, é que os dados não deveriam ser colectados de forma alguma pelas operadoras como está descrito no artigo, porque o @Pedro Varela quer fazer um seguro de saúde e pode ver barrada essa possibilidade porque ( suposições ) o seu tráfego de chamadas para hospitais com a sua operadora é grande e essa informação pode muito bem ser vendida e tríada.
    Não pense que estou a exagerar veja o que se passa na China com a chamada sociedade por pontos, se ainda não conhece os contornos deste monstro que está a ser criado, tenha sff a curiosidade de investigar .

    Os meus cumprimentos

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    1. Isso dá sociedade por pontos é do mais ediondo. Recuso completamente. Essa solução é defendida e obrigatória. Nós não estamos a falar de bases de dados com acesso aos organismos públicos, estamos a falar de acesso aos dados em caso de causa provável, com mandato de juiz e com acesso restrito a recolha de elementos de prova. Nem sequer investigação. A operadora que vender os dados paga multa, indemniza o visado e começa a perder licença de venda de serviços a clintes. Acho que as semelhanças entre o modelo chinês são anedótica. Já agora, se quer defender a sociedade democrática como eu, dê ferramentas à justiça para colher elementos de prova. Por essa ordem. De ideias, a colheita de movimentos bancários com mandato de juíz é fascista porque alguém. Os guardou primeiro para depois serem acedidos. No séc XXI só quer poder ter acesso a testemunhas oculares e flagrante delito? Isso é dar ferramentas aos populistas que estão a correr o ocidente a cavalgar esses anacronismos. Olhe mais atentatório às liberdades individuais são a oferta de descontos e benefícios aos clientes com cartões de fidelização, isso sim é uma verdadeira armadilha do capitalismo tardio.

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  5. Em Portugal temos um exemplo deste abuso ... Temos a Sonae que através da sua rede (NOS) envia SMS com uma promoção sempre que estas dentro de um hipermercado da concorrência. Usando apenas a METADATA da tua localização + METADATA dos produtos que consomes obtidos através do cartão cliente.

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